Decorreu, na Cidade de Maputo, nos dias 27 e 28 de Fevereiro de 2023, o seminário nacional, visando a harmonização de procedimentos na tramitação de processos de branqueamento de capitais, terrorismo e financiamento ao terrorismo.
Participaram no seminário 100 Magistrados Judiciais, afectos às secções criminais nos vários Tribunais Judiciais do país.
A sessão de abertura do seminário foi dirigida pelo Presidente do Tribunal Supremo, Adelino Manuel Muchanga, e contou com a participação do Ministro da Economia e Finanças, Ernesto Max Tonela, do Vice-Procurador-Geral da República, Alberto Paulo, do Secretário-Permanente do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Manuel Didier Malunga, e dos representantes do Banco Mundial em Moçambique, Julian Casal, e da Delegação da União Europeia em Moçambique, Abel Paqueras, entre outros convidados.
Participantes no seminário. Na primeira fila da esquerda para a direita: o representante da Delegação da União Europeia, Abel Paqueras, o Secretário Permanente do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Manuel Didier Malunga, Ministro da Economia e Finanças, Ernesto Max Elias Tonela, o Presidente do Tribunal Supremo, Adelino Manuel Muchanga, o Vice-Procurador-Geral da República, Alberto Paulo e o representante do Banco Mundial, Julian Casal
O Presidente do Tribunal Supremo, Adelino Manuel Muchanga, no seu discurso de ocasião, referiu que a iniciativa insere-se no conjunto das acções em curso no país visando viabilizar a retirada de Moçambique da Lista Cinzenta pelo GAFI.
O Presidente do Tribunal Supremo, apontou que o branqueamento de capitais, em todas as suas dimensões, designadamente a colocação de fundos ilicitamente obtidos no mercado formal e a circulação e integração de bens nos circuitos económicos legítimos, não só fomenta a concorrência desleal, como, também, resulta na penetração, pelos criminosos, no sistema financeiro nacional e internacional, facilitando a prática de outros crimes.
O Presidente do Tribunal Supremo destacou que o combate ao branqueamento de capitais e a prevenção e supressão do financiamento ao terrorismo, tornam-se uma prioridade para os dias que correm e as medidas a tomar, da parte dos tribunais, que incluem a responsabilização criminal, o congelamento e a perda de bens pertencentes ao autores, devem transmitir uma mensagem clara, de que o crime não compensa.
No discurso o Presidente do Tribunal Supremo referiu que a prevenção e combate ao branqueamento de capitais, terrorismo e financiamento ao terrorismo, não depende exclusivamente da actuação dos tribunais, em sede de apreciação e decisão, doravante, há que aumentar a transparência na constituição de empresas e adoptar maior controle das fontes de financiamento dos diversos empreendimentos.
O Presidente do Tribunal Supremo referiu, ainda, que a característica da transnacionalidade, de afectar ou envolver diversas ordens jurídicas nacionais, particulariza e faz da criminalidade organizada um desafio para os Estados, desde logo, porque os respectivos direito penal e direito processual penal são distintos: os ilícitos criminais e as garantias processuais variam ligeiramente ou significativamente de Estado para Estado e nenhum Estado pode lidar com o fenómeno de forma isolada, e por essa razão, os Estados devem adoptar uma multiplicidade de instrumentos jurídicos que prevêm, entre outras medidas, o alargamento da competência jurisdicional penal dos Estados, nomeadamente, através da superação do tradicional princípio da territorialidade.
O Presidente do Tribunal Supremo anotou que Moçambique tem vindo a adoptar, de forma paulatina, as medidas referidas, mas, há que reconhecer algumas limitações para perspectivar e equacionar os métodos e procedimentos probatórios mais idóneos e adequados a revelar e demonstrar a realidade sob investigação, e investir seriamente na criação de capacidade de investigação e esgotar o debate sobre os procedimentos de investigação.
O Presidente do Tribunal Supremo referiu, também, que os Estados debatem-se com o dilema de colocar, à disposição das entidades de investigação, meios mais invasivos e intrusivos ou de se abster de o fazer em defesa dos direitos fundamentais dos indiciados.
O Presidente do Tribunal Supremo, avançou, referindo, ainda, que a investigação da criminalidade organizada também dita o envolvimento de entidades privadas, máxime empresas de telecomunicações, entidades bancárias e instituições financeiras, entre outras, e nestes casos, há que equacionar a possibilidade de dispensa do dever do segredo profissional bancário, fiscal ou de outra natureza.
O Presidente do Tribunal Supremo desafiou que se mostra, por isso, importante regulamentar o procedimento de obtenção de informação sigilosa de modo a evitarem-se nulidades processuais. Ou seja, há que consolidar e melhorar as medidas, os instrumentos e as instituições até aqui criadas e implementadas.
O Presidente do Tribunal Supremo desafiou, ainda, que há que prosseguir com a reforma legal, tornando o Direito Penal socialmente mais abrangente, sofisticando os mecanismos de obtenção de provas do crime organizado e transnacional, mas sem pôr em causa os princípios estruturantes do processo penal e do sistema jurídico, nem os direitos e liberdades das pessoas.
O Presidente do Tribunal Supremo referiu que é neste contexto de debates, de dilemas e limitações que somos chamados a intervir e a Directiva nº 1/2023, de 25 de Janeiro, sobre a celeridade na tramitação de processos de branqueamento de capitais, terrorismo e financiamento ao terrorismo e o tratamento da informação judicial, resulta da consciência de que o sistema judicial deve ajustar-se constantemente às necessidades decorrentes de novas exigências nas áreas social, económica e política, e a exigência actual é da retirada de Moçambique da Lista Cinzenta, tal exigência, convoca-nos para um esforço adicional.
A propósito, o Presidente do Tribunal Supremo referiu, ainda, que mais do que a Directiva ou até a abundância de legislação, é no sentido de missão dos nossos magistrados que queremos acreditar e confiar. É no espírito patriótico e no orgulho de pertencermos a uma nação livre do crime organizado que nós queremos depositar a nossa certeza.
Por seu turno, o Ministro da Economia e Finanças, Ernesto Max Elias Tonela, referiu que no ano passado, o país foi colocado na lista de vigilância acrescida devido a preocupações associadas à deficiência no sistema de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, identificadas pelo GAFI e para ser retirado da lista, Moçambique precisa de tomar medidas para resolver questões suscitadas por GAFI.
O Ministro da Economia e Finanças referiu que estamos comprometidos em resolver as deficiências identificadas e melhorar a nossa contribuição para o reforço do sistema financeiro internacional e foi neste sentido que o Governo desencadeou, tempestivamente, acções com objectivo de assegurar a remoção do país de forma sustentável num prazo de 24 meses, e destaca-se, entre as medidas tomadas, a elaboração de uma estratégica detalhada para a implementação do plano de trabalho acordado com GAFI, com cronograma que envolve o reforço do quadro legal, o fortalecimento das acções das medidas de supervisão e medidas operacionais que assegurem eficácia no cumprimento da lei.
Apontou, ainda, que o Governo tomou, ainda, acções com vista ao reforço da cooperação internacional com outros países e organizações para o combate ao fenómeno de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, estabeleceu um comité executivo multissectorial de coordenação do qual faz parte o Tribunal Supremo que funciona com uma a tarefa de remoção do país da lista cinzenta e para este desiderato, o país deve demostrar progressos significativos e o sistema judicial desempenha um papel crítico no processo.
O Secretário Permanente do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Manuel Didier Malunga, referiu, na sua intervenção, que o Estado Moçambicano tem sofrido de forma cruel e directa por estes fenómenos de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, contanto que o branqueamento capitais traz consigo consequências nefásticas para o Estado, para economia e a sociedade no geral, na medida em que favorece a expansão do crime organizado, uma vez que permite aos criminosos a usar e tirar benefícios dos seus fundos ilegais, reduzindo assim a capacidade do Estado em colectar impostos e enfraquecendo o sistema de controlo da economia, e o financiamento ao terrorismo permite a invasão terrorista.
Outrossim, o representante do Banco Mundial em Moçambique, Julian Casal referiu, na sua intervenção, que sair da lista cinzenta é crucial para Moçambique, por uma série de razões: primeiro, promover o acesso aso mercados financeiros internacionais e continuar a atrair investimentos estrangeiros e participar no comércio internacional; segundo, estar na lista cinzenta pode prejudicar a reputação do país como um parceiro fiável e de confiança e isso pode ter implicações a longo prazo para o crescimento e desenvolvimento económico de Moçambique; terceiro, eliminar as deficiências de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo é essencial para criar um sistema financeiro estável e transparente; quarto lugar, eliminar as deficiências de branqueamento de capitais e do financiamento ao terrorismo é uma demonstração da capacidade de Moçambique para cumprir os seus compromissos internacionais.
O representante do Banco Mundial em Moçambique anatou que a contribuição dos tribunais e dos juízes para a saída da lista cinzenta do GAFI é fundamental e consiste principalmente em fazer cumprir e interpretar as leis e regulamentos do país relacionadas ao combate ao branqueamento de capitais e luta ao financiamento do terrorismo.
O representante da União Europeia em Moçambique, Abel Paqueras referiu que a União Europeia tem disponível, a pedido do Governo de Moçambique, de coordenar junto do Banco Mundial o Comité de Coordenação Técnica de Mecanismo Nacional para remoção de Moçambique da lista cinzenta do GAFI, e este objectivo só será possível e durável se se mantiver nos próximos meses o forte compromisso das instituições moçambicanas que estão demonstrando até agora e as acções desenvolvidas têm o carácter estratégico e não só de curto prazo.
O representante da União Europeia em Moçambique referiu, ainda, que no processo, com tanto actores, a coordenação será fulcral, como é indispensável o trabalho coordenado da cadeia da justiça criminal desde a detenção de potenciais indícios e suspeitos pelo GAFI, a importantíssima investigação judicial a ser feita pela SERNIC, passando pelas diligências a cargo da Procuradoria-Geral da República, até ao julgamento pelos magistrados dos tribunais.